Artista do mês: Rui Horta Pereira
Participou em inúmeras exposições colectivas, entre as quais: (2012) – M C M, curador Eduardo Hurtado, Galeria José Robles, ‘Jugada a 3 Bandas’, Madrid. (2010) – ‘Junho das Artes’, comissariado de Filipa Oliveira, Óbidos; ‘And Then Again’, comissariado de Ana Fonseca e Liz Collin, Museu da Cidade, Lisboa. (2009) – Drawing by Numbers, org. Vasco Barata, Espaço Avenida, Lisboa. (2008) – O Contrato do Desenhista, Plataforma Revolver, Curador Paulo Reis, Lisboa; Selecção – I Certame de dibujo contemporâneo Pilar e Andrés Centenera Jaraba, Guadalajara, Espanha. (2008 e 2009) – Participação na colectiva ‘Estética Solidária’, Espaço Abraço, Lisboa. (2005) – Jovens Criadores, Amarante; V Simpósio de Escultura Cidade de Cantanhede. (2003) – Escultura Na Cidade, Évora. 2000 – Olhar da Contemporaneidade, Festas de Lx, Lisboa. (1999) – Finalistas de Escultura, FBAUL, Lisboa. Desenvolveu, igualmente, um projecto apoiado pela Fundação Calouste Gulbenkian no âmbito do “Programa de Apoio a Projectos de Criação Artística”.
É uma relação muito intricada, diria indissociável, com nuances variadas, com concretizações diversas… Nos últimos tempos, tenho programado um conjunto de dispositivos com o propósito de produzir desenhos em determinadas condições. Para esses dispositivos elaboro um plano, desenhado, esquematizado, corrigido, etc… Dessa prática sobram, muitas vezes, os ditos dispositivos, que, para mim são esculturas, que acabo por apresentar. O curioso disto é o facto da acção inicial, que apresentava um objectivo de concretização muito concreto, ser suplantada pelo processo, pela experiência. Algo que está sucessivamente a acontecer no meu trabalho. Nem sempre corre bem. Como se de cada vez que quero chegar ao desenho tenho que encontrar, produzir, inventar, os instrumentos, sendo que o contrário também se verifica.
Existe uma contaminação latente, que se pode alargar a outras abordagens, desde que faça sentido para a investigação que quero realizar. Como tal, não existe uma hierarquia fixa. Tento servir-me dos meios que tenho à disposição, quantos mais melhor – o desenho e a escultura são aqueles onde me sinto mais confortável, aqueles que exploro mais intensamente.
Continuo a sentir uma grande ânsia de experimentação, aliás esse é um aspecto do qual não abdico, que considero mesmo fundamental para a minha sanidade, como artista. É um risco?! Uma incoerência!? Talvez. É um facto ainda assim…
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Sim! Sou o escultor, que utiliza o desenho pelo simples facto de ser esta a estratégia de raciocínio na qual tenho… mais treino. Esse raciocínio está vocacionado para resolver desafios visuais relacionando-os com tudo o resto. Quero insistir nisto para não passar a ideia de que estou a falar apenas de aspectos internos, digamos assim… É, forçosamente, uma relação em cadeia à qual, por vezes, tenho dificuldade em dar resposta.
Na maioria dos casos, a minha prática é suscitada por uma circunstância oficinal ou de ateliê, se preferires, por observação de um fenómeno, ou por causa de algum tema sobre o qual não sei nada e gostaria de saber.
Exemplo de uma estratégia paralela e que pretendia, exactamente, escapar às dinâmicas habituais, é o conjunto de filmes do projecto ‘Plano de Dobra’. O qual programei de forma distinta e constitui um importante mecanismo de reflexão para mim. Ter capacidade de me colocar numa situação discursiva, técnica, ou narrativa, onde ainda não tinha estado…. Se no final o resultado está próximo da escultura, do desenho ou do vídeo é sinal que consegui conduzir o processo com alguma eficácia.
A temática do tempo está presente, mas sempre me pareceu e parece que é um tipo de conceito onde se consegue enfiar tudo, que tudo abarca. Tem muitas acepções e daí essa sua elasticidade.
Na minha última exposição – ‘Around’ – existem dois aspectos muito concretos, que se relacionam com o tempo no sentido cronológico e que me interessam particularmente. O primeiro, da importância de uma acção exterior que não controlo, no caso a incidência do sol, estar incorporado no meu processo de trabalho, que obriga a uma espera a um acto de paciência. O segundo aspecto, que já me acompanha de outros trabalhos, relaciona-se com a efemeridade, com a perecidade do objecto, ou do desenho, ou da experiência.
Estou a trabalhar, de momento, em alguns projectos em que exploro isto mesmo. E tratam, também, da questão espacial e do movimento-tempo, pois implicam uma acção quase umbilical da minha parte. Na medida em que terei sempre que ser eu a executar, a repetir um processo que desaparece que se desmonta… algo que ensaiei com a experiência dos filmes e que estou a desenvolver, construindo roteiros, marcando tempos indicações de cena mas… a seu TEMPO, revelo.
Em rigor, olhando para a imagem o para os objectos que estão na exposição não se estabelece uma relação directa. Mas o que está na mesma, corresponde apenas à primeira parte.
Acho que um pouco por acaso os processos de criação aconteceram todos ao contrário, do tipo: fiz a sinopses dos filmes a posteriori aliás, quando apresentei o projecto anunciei-o assim mesmo. Os filmes são neste sentido, um processo inacabado, claramente inacabado, uma intervenção com um alcance subtil se é que chega aí… a exposição é, assim, um momento de concretização sobre e a partir dessa experiência. Podia dizer que é uma experiência fantasma uma vez que nunca a apresentei, ainda assim, todo o material escultórico deriva desse “movimento inacabado” ou do local onde aconteceu, ou dos objectos que encontrei, é, uma sequência com suportes diversos nos quais se inclui um desenvolvimento tridimensional umas vezes em peças únicas outras vezes em series é um procedimento diverso.
Existem outras “narrativas” que podemos encontrar nos teus objectos?
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Podes tentar prever isto, olhar o material produzido e afirmar: isto funciona com isto, isto é redundante… É uma prática necessária mas está longe de prever todos os cenários possíveis e é isso que é fascinante. Para resumir diria, que será difícil encontrar narrativas subterrâneas ou subliminares no meu trabalho, acho que é muito directo, só que isto sou eu a afirmar, logo, fácil! Tenho uma tendência para relatar a “narrativa” original explicar todo o processo, isto quebra muitas vezes as ligações intermédias. É necessário gerir muito bem o que expões e como expões – é um momento fulcral.
Para dar outra uma ideia, há uns anos atrás uma colega minha, com quem partilhava a fantástica aventura das visitas guiadas ao CAM, perguntava-me como é que eu desenvolvia o meu processo criativo. Lembro-me de responder que fazia vários ensaios, descritivos, desenhados, fotografados, entre outros, mas só quando conseguia resumir e explicar num parágrafo do que se tratava, é que sentia realmente que tinha o projecto controlado… podia chamar-se narrativa sintetizada.
Considero que temos um problema básico fundamental por resolver, quando digo temos refiro-me ao país, a maioria das pessoas considera a cultura um aspecto supérfluo na sua vida. Eu acho que é uma espécie de caminho anti barbárie no qual é necessário investir. Nota que investir aqui pode ser de muitas formas e, para mim, a principal é considerar a experiência artística como parte integrante da educação.
Retrocedemos, sim! Retrocedemos. Vou dar um exemplo, a grande maioria dos museus construiu e formou nos últimos anos sectores educativos, com pessoas qualificadas, com imensas ideias cujo objectivo fundamental era a criação de públicos, de levar esses públicos a ter uma experiência que alargue a sua percepção do mundo.
Se as escolas ou os pais não tiverem forma de pagar o transporte ou a entrada, por mais simbólica que seja, as visitas não se concretizam, logo, o que podia ser muito alargado fica muito restrito e nestas ligações elementares, falhamos.
Isto é apenas uma gota…
Deixa-me, no entanto, dizer que existem umas bolsas de respiração, sem decreto, claro! Existem instituições, galerias, fundações, coleccionadores, pessoas anónimas, muitos artistas, de todas as áreas, tal como cientistas ou investigadores, por exemplo, que acreditam que o que fazem é válido não só para eles mas para os outros. Pode não ser visível, pode mesmo demorar anos a ser útil. É necessário uma extraordinária persistência e resiliência? É! Se eu me conformo com isso?, não! O meu trabalho é o meu inconformismo e felizmente não estou sozinho. Mas estamos a perder o rumo e oportunidades. E ganhamos o quê? Intolerância, desinteresse, preconceito e uma tremenda falta de curiosidade que me desespera!
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3 + 1 Arte Contemporânea (Lisboa)
Exposição ‘Around’ na Galeria Quadrum
(C) imagens: Cortesia do artista, Rui Horta Pereira.