Nuno Tomás: Ordinários

Arquivo Fotográfico Municipal (Lisboa)

> 27.12.2013

19.11.2013 (18.30h): Conversa com Maria João Gamito e Nuno Tomás

Há realidades que se vêem melhor quando subtraídas à evidência da sua presença. É na clareza dessa subtracção – ou na sua iluminação – que se inscrevem as três séries de fotografias que Nuno Tomás apresenta nesta exposição. Em 165/96/S, nove fotografias em papel, cuidadosamente centradas na página que as contém, são o lugar visível de uma transformação ou de um desaparecimento e, portanto, a evidência de uma ausência – primeira condição da imagem e sua justificação mas também, e no caso específico da fotografia, a ausência como presença factual de alguma coisa que existiu e esteve lá como insignificância, nunca vista ou apenas vista de passagem, alojada na memória de quem, ao longo de dez anos consecutivos, frequentou dois colégios da Casa Pia, em Lisboa. Cinco anos depois de concluído o ensino básico, Nuno Tomás revisita os mesmos lugares com o objectivo de, nos cinco anos seguintes, lhes devolver a significação póstuma que, como vestígio aparentemente insignificante, se imprime agora na memória que cada fotografia consubstancia.

Sob o título 165/96/S (b), outras fotografias retiradas da mesma série, são reduzidas a uma estrutura gráfica coincidente com o indício de uma presença voluntariamente apagada, para que melhor possa sair de si para chegar a nós, como prova visível de uma presença extinta. Evidência de novo afinal, agora figurada numa sequência de negativos, previamente trabalhados em Photoshop e revelados, à escala do negativo, como quimigramas. Nesta operação em que fotografia e desenho se confundem na partilha possível de uma etimologia comum, a ausência presente na série anterior é simultaneamente designada na subtileza das manchas levemente azuis que habitam cada fotografia e, contrariamente ao que acontece na mesma série, no descentramento que nelas imprime uma instabilidade: a do negativo e a de todos os lugares que, enquanto memória, (nos) figuramos.Ordinário é o título de três caixas de luz onde, na ordem estabelecida por uma grelha e pela do mapa a que ela alude, um conjunto de positivos fotográficos dá a ver folhas de erva obsessivamente fotografadas em diferentes lugares da cidade de Lisboa. O que daí resulta é um mapa da cidade visualmente representado com o que invisivelmente a invade e percorrido à escala do que pisamos. Mapa absurdo, dadaísta, mapa de ininterruptas mortes e contínuos renascimentos, mapa passageiro de um efémero que apenas nos mostra o idêntico que informa todas as escalas porque, na sua evidência, a sobreposição de um positivo à sua cópia, onde um círculo recortado assinala luminosamente um minúsculo irromper de ervas, produz a esfera que, como corpo estelar ou planetário, guarda as suas enigmáticas formas de vida.

Nas três séries, as fotografias contêm o acto designativo que aponta com o nosso olhar o que devemos ver e contudo lhe resiste, e que mais não é do que a pertença a uma ordem comum que, nessa pertença, o torna ordinário. Até que, no seu movimento de saída, tanto de si como da comunidade a que pertence – na sua excomunhão – ele possa ganhar a sua dimensão extraordinária, que é a do extraordinário poder da sua aparição.

Nuno Tomás nasceu em 1991 na cidade de Lisboa. Licenciado em Arte Multimédia, vertente de Fotografia, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa onde frequenta atualmente o Mestrado na mesma área de estudos. Ordinários é a primeira exposição individual do autor.

Maria João Gamito é Professora Catedrática na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa e Professora Associada Convidada do Departamento de Arquitectura do ISCTE. Inscreve a sua actividade de investigação nos domínios da Cultura Visual, da Teoria da Imagem e do Desenho, no contexto específico da Arte Contemporânea. Autora de várias comunicações e textos publicados nestes domínios.

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