Musa paradisiaca: Audição das flores

> 28 Junho, 2014 

3+1 Arte Contemporânea (Lisboa)

A 3+1 Arte Contemporânea apresenta “Audição das flores”, uma mostra individual de Musa paradisiacaEduardo Guerra, Lisboa, 1986 e Miguel Ferrão, Lisboa, 1986.

“Audição das flores” existe em paralelo com a exposição “Audição das máquinas” que a dupla apresenta na Kunsthalle Lissabon até 28 de Junho de 2014.

Em “Audição das máquinas” e “Audição das flores”, Musa paradisiaca apresenta dois conjuntos de objectos, reunidos em duas famílias distintas, ainda que relacionadas entre si como cosmologias. Cada cosmologia, reunida sob um ponto de vista, ora das máquinas, ora das flores, resgata as qualidades de cada objecto para a sua discussão.

Que qualidades tem cada objecto e de que modo essas qualidades informam o ponto de vista apresentado? Que transformação opera cada objecto no conjunto a que pertence e como se altera por pertencer a cada um dos conjuntos?

Máquinas e flores são dois limites de um mesmo problema: a necessidade de adequação entre as formas ou a necessidade das formas que se adequam, que assinam em conjunto. A cada conjunto, sua assinatura, a cada assinatura, o seu modo de existência.

Fundidos em breu pintado, os objectos apresentados nas duas exposições participam da série “Aumentário”, iniciada por Musa paradisiaca em 2013.

Legenda da 1ª imagem: Musa paradisiaca, ‘Nuna beijando o Sol’, 2014, breu pintado, 52 x 43 x 43 cm. Fotografia: Cortesia dos artistas e 3+1 Arte Contemporânea, Lisboa.

Audição das flores (1)

– Concentra-te na coisa menor que tens, na menos presente, na mais invisível. Imita-a, imita-a até não saberes mais quem és (2).

O problema seria passar a ver o que as coisas pequenas vêem (3). Passaria os dias a pensar em sol, luz, ar e, inevitavelmente, confundia isso com calor, ver e respirar. As coisas pequenas transformavam-se noutras ainda, maiores, sempre maiores, e o raciocínio voltava.

– Vai embora que não quero pensar! Vai embora que já penso que não quero pensar. (4)

O exemplo das coisas vegetais, viver com o exemplo das coisas vegetais. (5)

(1)

As flores não são mudas?

A ideia é seguir o exemplo das coisas pequenas, ou mínimas. Estar atento à forma como as coisas pequenas se comportam. Desse modo, o nosso tempo abrandará, até ao ponto em que partilharemos um ponto de vista. Diz-se que se olharmos muito para uma coisa, acabamos por ser como ela.

As flores estão a fazer uma audição para quê?

Estas flores de que estamos a falar estão a fazer uma audição especificamente para se tornarem humanas, como se pudessem imitar os humanos. Foi-lhes pedido que interpretassem acções especificas, como parecerem-se com ossos e fluídos, por exemplo.

(2)

Não consigo concentrar-me. As máquinas não me deixam!

Mas não estás sozinho? Estás assombrado?

As células a flutuar nos meus olhos que são visíveis quando olhamos para o céu solarengo, aparentemente infinito.

Certo. Consegues focá-las? De onde vêm? Para onde vão? O momento crucial da percepção ocorre quando alguma coisa pára de se transformar noutra coisa, quando afirma uma presença.

(3)

Não vejo qual é o problema.

Porque, apesar de tudo, nunca conseguiríamos ser de facto flores…

Penso, logo existo o que, como residente da terra, é decepcionante, quando consideramos o impacto que infligimos todos os dias no meio ambiente e nas pequenas coisas, que têm muito pouca importância ou significado na nossa cultura contemporânea.

(…)

(4)

Penso que não vou. Posso ficar? Mesmo sem pensares?

É como a voz da consciência: vai-te embora ó razão, vai-te embora! Nunca poderias ficar.

Na verdade, a resposta da maioria. Eu também não, precisamos todos de estar conscientes dos sistemas e dos resultados das nossas intenções.

Será que as plantas têm intenções?

(5)

Por exemplo?

Ser planta, ser vegetal, ser sol e luz, do modo que elas são.

Não devia toda a gente?

(…)

Musa paradisiaca é um projecto artístico de Eduardo Guerra e Miguel Ferrão centrado no diálogo. Assente em parcerias temporárias com entidades de variada competência, Musa paradisiaca assume diferentes formas, mantendo um caráter discursivo e participativo. Daí deriva a proposta para a criação de uma família pensante que, a várias vozes, se afirma.

Mantendo, desde 2010, um programa editorial em www.musaparadisiaca.net, das sessões públicas que Musa paradisiaca realizou, destacam-se, em 2014, “Comissão de almas”, Palácio Foz (Lisboa); em 2013, “Como se apanha um fugitivo?”, CAM — Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa), “Tarefas Impossíveis (O Criado do Cenáculo)”, Palais de Tokyo (Paris), “Auto da emulação”, Cinemateca Portuguesa (Lisboa) e, em 2012, “Tiro à gota”, Old School (Lisboa). Das exposições coletivas em que participou, destacam-se, em 2013, “A Entrevista Perpétua”, Primeira Avenida (Porto) e, em 2012, “Tem calma o teu país está a desaparecer”, Galeria Zé dos Bois (Lisboa). As residências artísticas que integrou incluem o Laboratório de Curadoria (Guimarães, 2012), Novo Novo México (Abrantes e Mação, 2012), Aguêdê-Alê (São Tomé e Príncipe, 2012-2013) e Fábrica da Pólvora (Corroios, 2014). Musa paradisiaca foi bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian, em 2012, e finalista do Prémio EDP Novos Artistas, em 2013.

+ info:

Musa paradisiaca

3+1 Arte Contemporânea

Audição das máquinas

Kunsthalle Lissabon