Caveiras, casas, pedras e uma figueira

Atelier-Museu Júlio Pomar

> 16.02.2014

Curadoria: Delfim Sardo

A Exposição ‘Caveiras, casas, pedras e uma figueira’, integrada no programa de projectos paralelos da 3ª Trienal de Arquitectura de Lisboa, com obras de Álvaro Siza VieiraFernando Lanhas, Júlio Pomar e Luís Noronha da Costa, surgindo no terreno de convergência entre as diferentes disciplinas praticadas por estes autores, explora as estruturas através do desenho.

A curadoria da exposição é de Delfim Sardo que, há muito, insiste na ligação entre as artes plásticas e a arquitetura. Num espaço construído pelo Arquitecto Siza Vieira e ocupado pela arte de Júlio Pomar, as caveiras, as casas, as pedras e a figueira contam-nos a história de um desenho que é tanto «mentale», como sensível.

Do que falamos quando falamos de desenho?

Quando falamos de desenho colocamos dentro desta categoria os desenhos preparatórios de artistas, os desenhos de projecto, o desenho encarado como medium específico, os esquissos de arquitecto, os doodles de canto de página, as páginas de cadernos escolares cheias de reproduções de heróis de Manga, as indicações de direcção que garatujamos ou que nos dão para decifrarmos numa visita a amigos remotos, os resumos de conteúdos de reuniões, os organigramas, o mindmapping com que tentamos orientar as nossas escolhas futuras, os planos feitos em post-its, a escrita manual, gráficos, enfim, toda a actividade inscritora e descritora de processos de pensamento a partir de formas gráficas.

O desenho não é uma tipologia artística como as demais, mas, acima de tudo, uma prática. Uma longa e permanente prática que extravasa amplamente o campo do artístico para se diluir nas inúmeras tipologias de inscrição gráfica, fazendo parte da nossa aprendizagem de representação do mundo.

Se, numa primeira abordagem, este campo parece ser (e é) demasiado amplo para poder ser tratado como uma unidade (que não é), devemos então cingir-nos a um campo delimitado, cheio de regras de procedimento, cânones processuais, parâmetros de avaliação estéticos ou meramente qualitativos?

Não parece, sequer, que esse campo possa ser circunscrito, nomeadamente porque se existe, encontra-se sob o fogo crítico que o carácter derrisório do modernismo fez abater sobre as práticas artísticas, desconfiando de uma característica fundamental e tradicional da prática do desenho no interior das belas-artes: o virtuosismo. Se atentarmos um pouco no estatuto peculiar do desenho no interior do ensino das artes visuais, facilmente compreendemos que o desenho possui uma semelhança curiosa em relação à aprendizagem musical, ou ao ensino da dança em termos clássicos. Em qualquer destes casos existe uma necessidade interna de promover uma proficiência que passa por ser não-ideológica, isto é, pretende configurar-se como uma destreza da mão sem estilo, uma capacidade de representação desvinculada de qualquer ideia sistemática sobre os mecanismos e processos do próprio primado de representação que lhe subjaz.

De facto, o desenho é normalmente ensinado como uma técnica de representação, um sistema de recursos que implica determinadas competências específicas, bem como o domínio de códigos, de convenções em relação à formacomo o mundo pode ser convertido em linha. Repare-se: a sofisticação do desenho como processo de representação é inerente ao facto de o desenho ser o que não existe no nosso sistema perceptivo – o desenho é linha, demarcação, fronteira, contorno das coisas, convenção sobre o interior e o exterior. (…)

– excerto do texto de Delfim Sardo sobre a exposição

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Atelier-Museu Júlio Pomar

(C) imagens e texto: Cortesia Atelier Museu Julio Pomar. Imagens: © Luísa Ferreira| AMJP 2013.